INDICADORES DE TENDÊNCIA CIMILHO (81): Milho: Até tu, Clima?
17/05/2016 07:54:14



Rubens Augusto de Miranda
Pesquisador da área de economia agrícola da Embrapa Milho e Sorgo

Se não bastasse a conjunção de fatores específicos que levaram à atual e histórica alta dos preços do milho, o clima resolveu entrar nessa ciranda e bagunçar ainda mais a situação. Na primeira quinzena de maio, o preço médio da saca de milho no país ultrapassou R$ 42,00. Em circunstâncias normais esse já seria um valor exorbitante do cereal em qualquer lugar do Brasil, e estamos falando apenas da média. Em várias regiões consumidoras de grãos, o valor da saca de 60 kg já passou dos R$ 60,00.

Obviamente com o milho sendo cotado a preços historicamente semelhantes aos de soja, não há alta de insumos que prejudique os ganhos, e os que apostaram no milho para o inverno estão rindo à toa, excetuando-se aqueles que se depararam com estiagens. Infelizmente, essa é a típica situação na qual nem todos podem vencer. Os lucros extraordinários usufruídos pela maioria dos produtores estão sendo pagos pelos prejuízos dos mercados consumidores de milho.

É a lógica da oferta e demanda, e o milho nunca vendeu tão bem, a despeito dos preços estratosféricos. As taxas de comercialização têm indicado recordes de venda antecipada. Segundo os dados do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (IMEA), ao final de abril, 62,3% da safra prevista já havia sido vendida. Esse percentual para o respectivo mês de 2015 foi de 48,6%, e em 2014, foi de 11,5%. No Paraná, estado que colhe a segunda maior safrinha do país, a situação não é diferente. Até o final de abril, segundo informações da Secretaria de Agricultura e do Abastecimento do Paraná (SEAB), 21% da safrinha de milho já estava vendida. Apesar do menor percentual quando comparado ao Mato Grosso, é importante lembrar que o estado paranaense não tem tradição de vendas antecipadas de milho. Até recentemente, a comercialização da safrinha só começava em maio-junho e de forma lenta.

Frente a essa conjuntura, a expectativa de uma colheita recorde na segunda safra de milho proporcionava certo alento aos consumidores do cereal, pois era uma sinalização de redução dos preços no médio prazo. O problema é que faltou combinar com o clima. Nas últimas safras de inverno o fator climático vinha recebendo o crédito como um dos principais impulsionadores da produção, mas na safrinha de 2016 esta situação tem se revertido em algumas regiões.

A atual segunda safra de milho no Brasil iniciou o ano com grandes expectativas de igualar, ou mesmo superar, a colheita recorde de 2015. Entretanto, no mês de abril, as chuvas ficaram mais escassas que o normal, assim como o calor foi excessivo, em grandes regiões produtoras de milho de segunda safra do Centro-Oeste. No momento, diversas instituições já anunciaram a quebra da safra, mas a avaliação destas perdas ainda mostra grande variação, indo de 2 a 10 milhões de toneladas.

As dificuldades na safrinha do Mato Grosso iniciaram-se já na fase do plantio do milho, onde, apesar de um aumento na área, 30-35% do cereal foi plantado fora da janela ideal. Por sua vez, as áreas plantadas fora da janela receberam menores investimentos, em razão do maior risco, e o clima adverso veio para consolidar as perdas. A última estimativa de safra do IMEA sobre a cultura do milho no Mato Grosso já apontou uma redução de 16,5% na produtividade estadual. Caso isto se confirme, a produtividade média de 90,7 sacas por hectare será a menor registrada no estado desde a safra 2010/11. Felizmente, no cômputo geral, o aumento da área plantada com milho no Mato Grosso deve diminuir os impactos negativos da redução de produtividade. Entretanto, tal situação não se estende ao estado vizinho de Goiás, onde condições climáticas têm sido ainda mais severas.

No início de 2016, a Associação dos Produtores de Soja e Milho de Goiás (Aprosoja-GO) e a Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg) projetavam um aumento da produção da safrinha de milho no estado, com a expectativa de produção chegando a 8,2 milhões de toneladas ante os 7,6 milhões colhidos no ano passado. Em maio, a projeção despencou, e agora se espera algo entre 4,8 e 5,2 milhões de toneladas, ou seja, uma redução na faixa de 32-37%. Contudo, em várias regiões de Goiás foram observadas situações extremas onde as perdas podem chegar a 85%. Antecipando os prejuízos financeiros, os produtores goianos já estão negociando com os seus credores. Sobre essa questão, Bartolomeu Braz Pereira, presidente da Aprosoja-GO, recentemente afirmou que "a cada dia que passa, aumentam as perdas com a seca, e o produtor tem buscado amparo nas entidades de classe para obter melhor negociação".

Neste cenário, tem-se verificado um fato curioso relativo à comercialização. Se de um lado é louvável o aumento da prática de vendas antecipadas da safra como forma de proteção, de outro, tem-se formado um clima favorável a rupturas desses contratos por motivos distintos. Os que foram afetados severamente pela estiagem podem não ter milho suficiente para entregar, e os que devem colher bem podem não querer entregar.

Até o final de abril, de acordo com a Agroconsult, foram vendidos antecipadamente 28,7 milhões de toneladas da safrinha, principalmente para exportações. Segundo a consultoria, as tradings (empresas que operam com exportações e importações) têm indicado que muitos acordos de exportação podem ser cancelados para a venda no mercado interno, pois os preços domésticos estão mais remuneradores.

Apesar dos indícios de que os preços do milho devem continuar altos nos próximos meses, muita água ainda vai rolar nessa história. Primeiramente, é preciso dimensionar as perdas da safrinha. Segundo, os preços domésticos proibitivos começam a desestimular as exportações, podendo ocorrer até mesmo quebras de contratos. Isto pode fazer com que o milho brasileiro venha a perder espaço no mercado internacional no segundo semestre, além do reflexo das rupturas contratuais sobre as exportações no médio prazo. Há também a expectativa de importações de milho "barato" dos Estados Unidos e da Argentina.

Por fim, analisando o conjunto da obra, apesar de as notícias de quebra de safra impulsionarem ainda mais o aumento dos preços do milho no presente momento, também se tem aventado a possibilidade de melhoria da oferta doméstica do cereal, com as quebras de contratos de exportação. Em outras palavras, o próprio cenário adverso está viabilizando a futura diminuição dos preços do milho. É justamente isso que se espera das forças de mercado quando se advoga a sua eficiência. Não existe lado negro, há somente a lógica do mercado de estímulos e desestímulos frente a determinadas condições de oferta e demanda. O problema climático não foi uma apunhalada, pois em situações com incertezas os problemas em algum momento acontecem. Além disso, as condições meteorológicas nunca foram conhecidas como fiéis correligionários, cabendo ao produtor se precaver.

 

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